sexta-feira, 5 de outubro de 2012

Portugal, a crise e a imigração - a minha experiência

Desde já SORRY pelo testamento, nem sei se alguém vai ler tudo mas tinha de partilhar isto com vocês.

Engane-se quem pensa que eu não ligo a nada do que se passa em Portugal nestes últimos tempos.
É verdade que não vivo em Portugal, mas foi também por causa da crise que de certa forma eu resolvi sair de Portugal e rumar à Bélgica.

Aqui fica um pouco da minha história:
No Verão 2003, a minha mãe estava a trabalhar durante a noite (da meia noite até às 8 da manhã na limpeza do Gaia Shopping) e ganhava uma miséria e o contracto dela podia acabar de um momento ao outro.
O meu pai, estava a trabalhar num restaurante e pouco mais ganhava que a minha mãe. Trabalhava muito e poucas vezes estava em casa.
Eu estava a estudar e durante as férias (e como já era costume) estava a trabalhar num bar de praia e ganhava 2€ à hora e trabalhava TODOS os dias das 9 da manhã até às 7 da tarde. Tudo porque queria ajudar os meus pais e ter um dinheirinho para comprar as coisas que precisava para a escola.

Pouco antes tinhamos fechado a nossa sapataria e ficamos com imenso prejuizo. Todos os 3 trabalhamos imenso para ter aquela sapataria a funcionar, mas fecharam a rua para fazer saneamentos, logo ninguém podia passar ali... 3 meses mais tarde e depois de muito apertar o cinto, tivemos de dar o braço a torcer pois era impossivel continuar a sustentar aquela empresa mais os nossos custos de vida normais.

A minha mãe tinha 38 anos e o meu pai 42. E sempre que iam à procura de emprego era sempre a mesma história: eram velhos para trabalhar!!!

A minha "tia" que vivia na Bélgica estava de férias em Portugal e eu convenci os meus pais a terem uma conversa com ela e ver se poderiam vir para a Bélgica, quem sabe teriam mais sorte por aqui.
A minha tia disse que OK, que os ajudaria nos primeiros meses. Então a  minha mãe aproveitou a boleia e veio com ela uma semana mais tarde. O meu pai e eu ficamos até termos tudo em ordem para ele poder ir também.
No fim de Setembro o meu pai veio para a Bélgica e a minha mãe já estava a trabalhar por aqui e acolá a limpar. E eu fiquei sozinha... e como o dinheiro era curto eu disse logo que queria dar o meu salário todo para pagar as despesas da casa.

Foi muito dificil para mim ficar sozinha em casa sem os meus pais.
Começou a escola e eu cada vez mais me sentia sozinha e tinha muitas dificuldades em conciliar estudos e gestão da casa e de todo o tipo de papéis como por exemplo ter que ir às finanças etc.
Eu tinha 19 anos, já não era nenhuma criança mas foi um pouco um choque ficar sozinha de um dia para o outro ainda por cima não tinha ninguém ali perto,  nem de familia nem de amigos, todos viviam longe.

No final de 2003 vim passar o Natal junto dos meus pais. Fiquei por aqui 2 semanas e começei a analizar bem as coisas e cheguei à conclusão que aqui teria uma vida melhor.
Na noite de fim do ano de 2003, recebi a pior notícia de sempre... o meu primo, aquele que era como meu irmão, tinha morrido. Eu fiquei sem chão, sem saber como iria fazer quando voltasse a Portugal. Eu passava imenso tempo com ele, ele era mais novo do que eu tinha apenas 17 anos e uma vida inteira pela frente!
Tudo isto foi demais para mim, e mal voltei a Portugal decidi desistir da escola (estava no 12°ano, eu sei fui burra!) e tirar a carta de condução e vir o mais depressa possivel para a Bélgica.

Assim foi, no dia 28 de Abril tinha a minha carta de condução nas mãos e no dia 1 de Maio cheguei à Bélgica. Foi um choque e a verdade é que nos primeiros meses o que eu mais queria eram mesmo voltar para Portugal. Felizmente 20 dias mais tarde estava a trabalhar num hotel na limpeza. E sim é um trabalho duro, pesado e mal pago mas eu não ligava muito pois o meu objectivo era mesmo aperfeiçoar o meu francês. Trabalhei lá 1 ano e alguns meses quando fui para o meu ex emprego. Trabalhei como secretária administrativa durante 6 anos e meio. Fiz um curso à noite para aprender a segunda língua do país, o holandês ou flamão (como queiram) pois as portas do mercado de trabalho ficariam mais abertas para mim com isso.
Entretanto acabei com a minha relação de 5 anos com o meu ex namorado e pouco tempo depois conheci aquele que é hoje meu marido e pai do meu filhote.

Os meus pais continuam a trabalhar por cá e não tencionam voltar para Portugal antes da reforma. Eu consegui um novo emprego graças à minha experiência profissional e força de vontade.
Continuamos a ir de férias a Portugal, porque aí temos a nossa familia toda, que ela também vai sofrendo todos os dias com esta maldita crise. Os meus pais continuam a pagar o apartamento e tudo o que implica ter uma propriedade em Portugal, mas é muito triste ver ao que chegou Portugal.

Para mim é dificil ver as noticias e de que cada vez mais as coisas estão dificéis... a minha familia, os meus amigos estão aí... eu saí do meu país para poder viver e não sobreviver. Engane-se quem pensa que é fácil, desde já saibam que é muito dificil dar um tal passo na vida. (Ái as saudades!!!!) Sobretudo para pessoas como os meus pais que sempre trabalharam imenso para terem o que tem hoje, e ter de deixar o país deles (e nessa altura a filha) e vir para outro onde tiveram que aprender uma nova língua e onde tiveram de se adaptar.

Por isso eu digo a quem tiver essa oportunidade, saiam de Portugal e tentem a vossa sorte em outro lugar. Pode não ser fácil, mas nós somos fortes e habituados a lutar para ter alguma coisa na vida.

2 comentários:

  1. É verdade.
    Aqui em Portugal não está nada fácil.
    Logo em Janeiro regressarei a Moçambique para ao pé do meu marido. Andamos um bocado desanimados com a distancia. Senão mesmo tristes. Pois casámo-nos para estarmos perto um do outro.
    Quando tive que regressar a Portugal tentei encontrar um trabalho, qualquer coisa para ganhar algum dinheiro. Mas a verdade é que nem para entrevista chamam (o que é desesperante).
    Não tenho outro remédio senão voltar para lá. Apesar de algumas carências é o melhor a fazer.
    Beijinhos e obrigado por partilhares a tua história. É uma lição de vida. E tu és uma mulher de coragem.

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    1. Obrigada Rita, pelas tuas palavras, do fundo do coração! :)
      Imagino o quanto deve ser díficil para vocês estarem longe um do outro, deve ser mesmo duro.
      É mesmo horrivel o que se passa nestes últimos anos em Portugal, e como podes ver a crise já anda à algum tempo e tenho a sensação que cada vez está pior... é mesmo horrivel nem sequer seres chamada para uma entrevista!
      É com prazer que partilho um pouco da minha vida mais privada, e espero que sirva a outras pessoas como "exemplo" e que se puderem deixar Portugal que o façam.

      Beijos!

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